A Câmara Municipal de Rio Grande, no Sul do estado, gastou em reformas mais do que o valor total do prédio, em um período de três anos, segundo aponta investigação. Uma perícia encomendada pela RBS TV revelou que houve superfaturamento no custo dos serviços.
Entre 2015 e 2017, o gasto com as obras chegou a R$ 2,2 milhões, enquanto que o valor de mercado do prédio da Câmara é de R$ 1,8 milhão.
Na segunda-feira (4), um empresário foi preso. Ele é responsável pela TV Câmara, e é investigado por oferecer propina ao atual presidente da Casa, Flávio Veleda Maciel (Solidariedade), que denunciou o esquema. Uma outra obra, orçada em R$ 1 milhão, foi cancelada pelo parlamentar por suspeita de fraude.
Em depoimento ao Ministério Público, o empresário negou o envolvimento no esquema.
“O que aconteceu mais recentemente é que houve outras provas, de que o contrato era montado com sobrepreço para que se pudesse oferecer vantagens a agentes públicos”, salienta o promotor de Justiça José Zachia Alan.
Em maio, o presidente da Casa demitiu o diretor da Câmara após receber uma proposta para entrar num suposto esquema de propina.
“Ele trouxe o recado que, com relação às obras, era 50% do valor previsto para o presidente, e tinha situações que dava para tirar até 70%”, conta o presidente.
As análises foram feitas pela perita judicial Daniela Simões Lopes, de Pelotas, município vizinho de Rio Grande. Especializada em engenharia, ela inspecionou o prédio e conferiu as notas fiscais que a reportagem conseguiu por meio da Lei de Acesso à Informação. O laudo tem 16 páginas.
“A qualidade (do piso) é extremamente baixa, totalmente danificado”, diz a perita. “A gente tem presença de fiação aparente, com emendas inadequadas, perigo iminente de incêndio, de curto”, completa.
Na documentação oficial da Câmara, a perita descobriu que, no ano passado, o orçamento de uma empresa de reformas previa o pagamento de R$ 340 por hora de trabalho para um servente de obra, e de R$ 320 para um auxiliar de eletricista. Isso representa, segundo análise, quase 1.500% acima do valor de mercado.
“Eles basicamente vão ter um valor de quase R$ 50 mil o salário mensal. E isso é totalmente inaceitável, fora de mercado”, acrescenta.
Um documento oficial da Câmara, de 21 de maio deste ano, mostra que o responsável pela manutenção do prédio pede a compra de quatro novos reservatórios de caixa d’água porque os atuais, de 1997, nunca haviam sido trocados. Porém, notas fiscais de dezembro do ano passado, descrevem justamente a aquisição de quatro equipamentos, a R$ 2,5 mil cada.
Presidente na época, Charles Saraiva tentou se explicar. “Não tenho como fazer um levantamento a respeito de quanto custa hora, quanto não custa, qual valor que vai custar. Até que se prove o contrário, eu acredito, acima de qualquer coisa, na idoneidade dos funcionários de carreira da Câmara, que são os que fizeram todo o processo de licitação”, alega.
Tentativa de suborno gravada em áudio
O presidente da Casa gravou a conversa com o responsável pela TV Câmara, Marcos Marcelo Leão Coelho, que está preso. A propina seria para renovar o contrato anual com a empresa, de R$ 1,3 milhão. No áudio, ele diz que o valor do suborno estaria incluído no contrato.
“O nosso contrato da TV, tem ele montado justamente para poder ajudar”, diz Marcos Marcelo Leão.
A propina ofertada ao presidente da Câmara seria de R$ 30 mil por mês, segundo uma testemunha que prestou depoimento ao Ministério Público. Essa pessoa teria sido procurada pelo empresário para intermediar as conversas com o vereador.
“Foi uma proposta de R$ 30 mil, sendo que seria R$ 20 mil para o presidente, pela renovação do contrato, e R$ 10 mil mensais para eu passar o recado”, diz a testemunha, sem ser identificada.
Além de negar participação no esquema ao MP, o empresário também não quis ouvir a conversa gravada pelo presidente da Câmara.