Quando o complexo virar simples: valorize a sua jornada

Esses dias um aluno me chamou, pois queria passar um trabalho. Ele não se sentia apto, por não ter muita experiência na atuação em perícias, a defender um cliente e lembrou do meu nome. Era uma contestação de ITBI, uma recompra de terreno onde a prefeitura do município estava arbitrando um valor bastante elevado para uma área pequena. Pedi que me enviasse a documentação, e de cara já me espantei com o primeiro parágrafo do “laudo” feito pelo Município. Dizia mais ou menos assim: “em virtude das características do imóvel não é necessária vistoria ao local para a execução da avaliação”.

Como assim? Como um profissional do quadro técnico do setor de avaliações de uma grande cidade escreve isso num “laudo” de avaliação? Não é possível que seja considerado, em qualquer esfera, administrativa ou do judiciário, um laudo em que o profissional faça uma avaliação sem ter ido ao local. Seria desconhecimento da NBR 14653- Avaliação de imóveis? Duvido!

Esse foi meu primeiro pensamento. Talvez um tanto arrogante. Até eu me dar conta de que nem sempre foi tão rápido e tão simples encontrar uma fragilidade a ser contestada. Um dia já fui como o aluno. Só a prática, a troca de experiências e o estudo transformam nosso olhar. Como tudo fica tão mais simples com a experiência, tendemos a desmerecer nosso próprio conhecimento, a esquecer o tanto de tempo e investimento que custou para termos um olhar apurado.

Não cheguei nem a me atentar aos números e valores, mas comecei a analisar o laudo pelo viés da construção dele mesmo de acordo com os parâmetros da NBR 14653, e ele estava longe de ser correto. Nesse caso, o desconhecimento, ou tentativa de “facilitar” o trabalho, poderia ter custado caro ao contribuinte – ou mesmo ao Município, cuja fragilidade da defesa abriu portas para a contestação antes mesmo de análise da correção dos números em si.

Por outro lado, isso me chamou a atenção para outro fator: há um mercado enorme de trabalho para quem conhece – mas conhece mesmo -, normas técnicas, de avaliação, de patologia, de cálculo, de leis, de termos e assim por diante.

Lembrando sempre que um bom trabalho não é feito somente de técnica; a técnica deve ser comunicada. O poder da argumentação é tão importante quanto o conhecimento para o êxito de um trabalho. Quanto mais se faz, mais se aprende. E quanto mais se aprende, mais se quer aprender.

Num trabalho de assistente técnico, devemos defender o nosso cliente através da técnica e apontar os erros dos outros quando isso for necessário. Tudo dentro da ética, obviamente. As contestações e apontamentos devem ser contra o trabalho; jamais contra o profissional, que é nosso colega.

Olhando por cima, achei fácil impugnar este laudo, sem chegar na questão da avaliação propriamente dita. Mas isso porque tenho 20 anos de atuação na área e já exercitei meu olhar para enxergar esse tipo de erro. Porém, pra quem tem menos experiência e está começando agora a atuar na Engenharia Legal talvez seja um pouco mais complicado, por simplesmente não ter essa vivência.

A estes, em início de carreira, eu daria uma dica: jamais façam qualquer trabalho técnico sem embasamento numa norma. Esse é o Norte para tudo – seja para construir um bom trabalho ou para defender um cliente de um mal trabalho. E cabe a nós também, mostrar aos nossos clientes, que o nosso conhecimento deve ser bem remunerado. Afinal, muitas vezes ele é definitivo para resolver questões de seis ou mais dígitos. Por mais que pareça fácil, jamais nos esqueçamos o quanto caminhamos até chegarmos a esse ponto.

O que desejo para meu aluno agora é que ele persista, até chegar ao ponto em que tudo fica mais simples. E que, quando esse dia chegar, jamais esqueça da trajetória que construiu. As ferramentas para isso, ele tem: curiosidade, vontade de aprender, humildade para pedir ajuda.

Fonte aqui.

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